Como ler sobre a paixão sem cair na lamechice, e
afogar-se na enxurrada de adjectivos e substantivos em erosão. A literatura é
como uma veia ou artéria, uma das ruas de sangue que alimentam o coração dos
homens. Com Romeu e Julieta, os dois amantes condenados ao equívoco amoroso,
Shakespeare, assentou definitivamente o tema, instituindo um modelo universal.
O nosso Camilo, homem de paixões reais, escreveu com mão de mestre, Amor de
Perdição, a paixão assolapada de Simão e Teresa e a tragédia das famílias
rivais Botelho e Albuquerque. Eça com os seus Maias (Os), definiu a excelência
da paixão funesta da literatura nacional. Tristão e Isolda, o amor adúltero do
cavalheiro pela princesa, a velha lenda celta deste casal infeliz foram
apropriadas por Wagner, a música inspirada na literatura, inesquecível. A
Canção de Amor de Alfred J. Prufrock de T.S.Eliot, um dos poemas de pelos quais
vale a pena chorar, no entanto a poesia é parcelar e não conta histórias, as pessoas
tanto como amam as paixões, amam sobretudo as histórias de paixões. O amante
rejeitado, romantismo puro é Jay Gatsby, em o O Grande Gatsby, a vida como uma
série ininterrupta de gestos bem-sucedidos, amores, renúncias, enganos, Swann
que ama Odette que o não percebe, prosa perfeita de Marcel Proust com Um Amor
de Swann, paixão inexplicável a de Archer que ama a condessa Ellen Olenski que
o não recebe, A Idade da Inocência, de Edith Wharton, desencontro constante.
Madame Bovary de Flaubert e Ana Karenina de Tolstoi, dois monumentos à tontice
das mulheres apaixonadas pelo homem errado, o canalha. Tão violento que nenhum
homem o conseguiria escrever assim, O Monte dos Vendavais, de Emily Brontê,
talvez o relato mais destruidor, se não leram pelo menos um livro de paixões,
leiam este, e da sua irmã Charlotte, Jane Eyre faz com que a familia tenha
produzido duas obras-primas. Nabokov conseguiu escrever Lolita, leiam por amor
de quem quiseram, e ao de leve Milan Kundera com A Insustentável Leveza do Ser,
com final feliz e personagens que chegam a velhas, leiam O Amor nos Tempos de
Cólera. E se ainda tiveram folego leiam A Mancha Humana de Phlip Roth e de Ian
Mcewan a Expiação.
Se me perguntarem o que fica de fora, fica muita e boa
literatura.
Sem comentários:
Enviar um comentário