segunda-feira, 31 de maio de 2010

ExtraTexto

Clint Eastwood 1959 - CBS Photo Archive


domingo, 30 de maio de 2010

Por Amor ao Amor

Elizabeth Siddal ( desenho de Dante Gabriel Rossetti)

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A 23 Abril de 2010, chegou à livraria pelos correios enrolados em papel graft e com o rótulo da Relógio D’Agua, 12 exemplares de “Adoecer”, o ultimo livro de Hélia Correia, uma bela mas trágica historia do amor entre Dante Rossetti e Elizabeth Siddal. Esquecidos e não escondidos ao contrario do livro verde de Lizzie, restam 6 livros por vender.
Por amor ao amor, não deixem Adoecer, este livro que permanece na estante implorando para ser lido apaixonadamente.


“Mas no início de 1850 aconteceu apenas que ele e Lizzie se conheceram. Mal falaram um com o outro e, ao longo dos meses, ninguém viu surgir entre eles um sentimento especial. A verdade é que Dante e Beatriz se observavam sob a chuva inglesa. Não caminhavam um para o outro, pois sabiam que o movimento iria acontecer, independentemente da vontade. Ninguém viu, pois não era visível, que eles tentavam evitar-se, fugir ao temporal que inexoravelmente os arrastava. Temiam-se um ao outro. Os mais sensíveis perceberiam, se não ódio, desespero na maneira como ele a encarava e ela se furtava ao seu olhar.”
Adoecer de Hélia Correia, Ed.Relógio D’Água

“A encadernação de pergaminho estava gasta e a cor desbotara, mas não tinha manchas, nem riscos, nem quaisquer marcas de uso. O livro parecia ter sido comprado numa «visita a Londres» setenta ou oitenta anos antes, e ter ficado de alguma maneira esquecido e escondido. Envolvia-o um ligeiro e delicado odor a mofo, como o que às vezes assombra uma peça de mobília antiga com mais de um século. As contracapas, no interior da decoração, estavam estranhamente ornamentadas com desenhos coloridos e ouro velho. Parecia pequeno, mas o papel era fino, e tinha muitas folhas, completamente cheias de uma letra miudinha traçada com esforço.”
O Livro Verde de Elizabeth Siddal, Os Pré-Rafaelitas, Ed.Assírio&Alvim

Turn thou away thy false dark eyes
Nor gaze upon my face;
Great love I bore the: now great hate
Sits firmly in its place.

Elizabeth Siddal

(I saw her smile.) But soon their path
Was vague in distant spheres:
And then she cast her arms along
The golden barriers,
And wept. (I heard her tears.)

Dante Gabriel Rossetti.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Guerra Sem Fim




Existem diversos livros sobre as guerras do Afeganistão e do Iraque e sobre a guerra contra o terrorismo - Mas este texto é muito diferente. Em Guerra Sem Fim, Dexter Filkins não analisa como e por que razão aconteceram estas guerras, ou se foram bem-sucedidas ou falharam. Em vez disso captura com um imediatismo cortante e experiência humana e consequente tragédia da guerra.
Conhecemos insurrectos iraquianos e soldados americanos, rebeldes afegãos e clérigos talibãs. Viajamos por desertos, terras gélidas e montanhas, pelos cenários de execuções públicas e amputações, de atentados suicidas e pelas casas dos próprios bombistas. O resultado é um retrato visceral da guerra contra o terrorismo, das suas vítmas, das pessoas que nela combatem e das suas vivências - um mosaico absolutamente lógico dentro do absurdo contexto da guerra.
De um realismo atroz e palpável, Guerra Sem Fim tem todavia o mérito da imparcialidade: ao contrário de repórteres que se celebrizaram por se oporem retoricamente à intervenção americana, Filkins não faz proselitismo fácil - conta o que viu e ouviu dos personagens que viveram o drama, mas deixa ao leitor a tarefa de tirar conclusões.
Guerra Sem Fim de Dexter Filkins, Ed. Casa das Letras.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Papel de Embrulho


Chegou hoje o novo papel de embrulho da SolMar, criado por André Laranjinha.
Uma homenagem a Antero de Quental.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Romance da Grande Cidade





Alfred Döblin nasceu em Stettin (actual Szczecin, Polónia), em 1878. Cresceu em Berlim, onde praticou medicina até 1933, altura em que a sua obra foi proibida pelos nacionais-socialistas; Döblin procurou refúgio na Suíça e, logo depois, em França. Com o início da guerra, passaria em 1940 por Portugal, a caminho dos Estados Unidos da América, de onde só regressou à Alemanha após o termo do conflito. Viria a falecer em 1957, em Freiburg.
O seu primeiro romance foi publicado em 1916 e, em 1929, a sua obra mais importante, Berlim Alexanderplatz.
Berlim Alexanderplatz, a obra-prima de Alfred Döblin, é porventura o mais importante contributo alemão para o «romance da grande cidade», palco das vivências típicas das sociedades industrializadas do século XX.
E é, além disso, uma referência fundamental para os admiradores do romance modernista, situando-se ao nível de um Manhattan Transfer, de John dos Passos, ou de um Ulisses de James Joyce .
O romance foi adaptado duas vezes ao cinema, em 1931 e de novo 1980, por Rainer Werner Fassbinder.
Um dos 100 livros mais importantes de sempre, uma obra prima da literatura.


Berlim Alexander-Platz de Alfred Döblin, Ed. D.Quixote

terça-feira, 25 de maio de 2010

Com os Pés dentro de Água





«Dir-se-ia que estamos perante um confronto desmedido que é o de Urbano Veneza; Veneza lugar, Veneza cidade, Veneza cor, Veneza pintura e pintores, tantos, tão grandes que o desafio nos aparece como um risco suicidário, e , no entanto, aqui nos encontramos perante papeis, as telas, os cadernos de um pintor português. (…)

Urbano nasceu também com os pés dentro de água, nasceu numa ilha dos Açores, S.Miguel, na fronteira da água e da terra, no lugar incerto da lama que proporciona conhecimento do fogo também. A experiência que este pintor tem de Veneza não é episódica nem turística, é vivida e material, os cadernos de esboços que leva de Portugal já viajam preparados não só com a cor mas com a matéria dos muros de Veneza, muros trabalhados pelo tempo e pela água, tal como a pintura de Urbano em plena sintonia com a erosão, na fronteira entre os elementos.»

José Luís Porfírio
Outubro de 2004.


Cadernos de Veneza, à venda na nossa livraria, edição da Galeria 111.

domingo, 23 de maio de 2010

Vivemos aqui

This Is Where We Live from 4th Estate on Vimeo.

Welcome to our city - to our world - of books. This is where we live.

A film for 4th Estate Publishers' 25th Anniversary. Produced by Apt Studio and Asylum Films.

The film was produced in stop-motion over 3 weeks in Autumn 2008. Each scene was shot on a home-made dolly by an insane bunch of animators; you can see time-lapse films of each sequence being prepared and shot in our other films.


viajante de cartolina

Hoje não me apetecia escrever. Não que não haja sobre o que escrever mas não me apetece escrever mais sobre a visita do papa ou escrever alguma coisa sobre os aumentos de impostos como medidas de austeridade.
Apetecia-me sair daqui para fora por uns dias. É que corro o risco de me transformar num penedo de basalto se não me atiro ao caminho.
O que queria mesmo era ir a Nova Iorque ou à Grécia que como se sabe está também em apuros. Eu não lhes levaria esperança já que também sou um pais necessitado, somente ver a Acrópole de Atenas pela qual nutro um certo fascínio. A Nova Iorque, uma das minhas cidades feitiche, iria já. Faria um périplo pelas galerias de arte e pelos bairros chiques sem esquecer as zonas degradadas e perigosas, ainda que me arrisque a ficar a detestar a cidade. Essa minha inclinação por Nova Iorque só pode ter a ver com leituras e filmes. E isso como se sabe é enganador porque a metrópole que fui retirando dos filmes e livros não é necessariamente a Nova Iorque real. Woody Allen foi o meu primeiro cicerone da cidade. “Manhattan” é um daqueles filmes extraordinários, filmado a preto e branco por mestre Gordon Willis, com diálogos primorosos e uma visão romântica da cidade. Mas John dos Passos também me apresentou literariamente a cidade em “Manhattan Transfer” , uma trilogia ambientada na Nova Iorque dos anos vinte com diversas tomadas de vista, de ângulos variados. E depois há a Nova Iorque de Andy Warhol, de Keith Haring, de Jean-Michel Basquiat, a Nova Iorque de Henry Miller, a Nova Iorque de Martin Scorsese. Bem não sei qual delas prefiro mas já me contentava com a real. E enquanto não vou a Istambul sempre posso ler o Orhan Pamuk
Mas como sedentário forçado pelas circunstâncias vou-me apaziguando ao espreitar por essa janela debruçada sobre o mundo que é a net. E já não é mau.

Com Perfume e Com Veneno

«Os membros do gabinete do senhor Presidente estavam em pânico. Há dois dias que procuravam contactar, por telefone, a pequena ilha para anunciarem a data do programa da visita constitucional. Mas o telefone apenas devolvia ruídos intermitentes que não forneciam qualquer interpretação técnica. Era como se estivessem a ligar para o ponto zero do quintal mais próximo. E, no entanto, era urgente cumprir a lei que prescrevia: «Ao menos uma vez por mandato, o governo visitará cada uma das suas ilhas» Faltava a mais pequena e mais distante. É que, passado quase um século, o mandato terminava na semana seguinte e, em vésperas de eleições, nenhuma ilegalidade podia transformar-se em trunfo nas mãos da oposição. Só que o telefone não atinava com aquela ilha pequena e distante. O eco nem tinha forças para lhes devolver o apelo.
Houve que reunir de emergência. As calvícies aumentaram, branquearam cabelos, fizeram-se esforços suplementares e aconteceu o habitual: suores frios e derramamentos cerebrais. Mas não conseguiram qualquer contacto com a ilha, mesmo com funcionários destacados para discar o número durante vinte quatro horas.
Sobre a mesa de reuniões, puseram todas as hipóteses: avaria do único telefone da ilha (a Companhia não o podia comprovar e, muito menos, reparar); que os habitantes andavam a festejar o Espírito Santo (era época disso); que estavam a ensaiar folclore (em tempos, tinham-lhes prometido um passeio); que os membros da filarmónica estavam a aprender a tocar o hino para a eventual visita do senhor Presidente; que se mantinham ocupados em qualquer acontecimento social. Mas em circunstância alguma, ficariam impedidos de passar, mesmo que fugazmente, pelo telefone.
Puseram, então, hipóteses mias convencionais: descontentamento com a governação (nem sequer conheciam o senhor Presidente); mudança de pátria (a América ali tão perto e muito mais rica); alguém com a conivência do padre, dera o grito de independência e pronto. (…)
Partiram como calhou. Pouca bagagem. Nada de coisas supérfluas. O Chefe de gabinete meteu, na pasta, o mais importante: o discurso que o senhor Presidente iria proferir- o mesmo que já lera nas outras ilhas. Enfiaram também três jornalistas e um operador de câmara de televisão para o registo óbvio. Era o q.b..
O senhor Presidente enjoava a bordo e, por simpatia, os membros do gabinete enjoavam também. Era bonito ver toda aquela solidariedade governativa. Conseguiam mesmo imitar os roncos presidenciais que, com a continuidade, desfaleciam até se transformarem em gemidos agónicos. Mas só numa viagem como aquela se conseguia avaliar o sacrifício de governar ilhas.» (…)
O barco foi-se aproximando. Reduziu a velocidade e deslizou como tapete rolante ou mosca sobre taça de gelatina. E quando o cais ficou à mão de atracar, já todos tinham caído no oceano do desânimo. É que nem as autoridades autárquicas, nem a filarmónica, nem grupo de folclore, nem o padre, nem qualquer pessoa, se postara sobre o cais para esperar tão ilustre comitiva. Os jornalistas sentiram-se, enfim, analfabetos e o operador de câmara o escravo de todas as máquinas inúteis. Pela primeira vez, era possível provar que se pode reduzir qualquer governo à sua insignificância.» (…)

Com Perfume e Com Veneno de Álamo de Oliveira, Ed. Salamandra 1997

quinta-feira, 20 de maio de 2010

À Procura Da Grande Estratégia


«À medida que avançamos na idade, a nossa percepção da vida vai-se alterando profundamente: as fúrias e mágoas que tantas vezes sentimos, os desgostos e as decepções perdem-se numa névoa difusa e as benções que recebemos tornam-se mais vivas e ganham novos contornos. Apercebemo-nos de que quanto somos e fazemos resulta da dádiva que nos fizeram os nossos pais- ao transmitirem-nos aquilo que de melhor souberam e puderam- e da sorte dos encontros e também dos desencontros que a vida nos foi oferecendo.
Dos meus encontros açorianos tenho falado várias vezes, mas hoje queria recordar especialmente o que tive com o Mário Mesquita, na JEC de Ponta Delgada, da qual viríamos a ficar tão longe, e que deu início a um percurso intenso de amizade e camaradagem que os anos mais não fizeram do que reforçar. A minha admiração pelo Mário Mesquita, homem de cultura, jornalista e cidadão exemplar, foi sempre crescendo e, quando ele me convida para qualquer iniciativa, I always come running, para evocar o título do belo filme de Vincent Minelli.
Quando o Mário me pediu um título para a minha intervenção, respondi-lhe, quase de imediato, com um que não o deixou especialmente feliz, New Deal: «Nothing will bring back the hour of the splendor in the grass» ?, em homenagem ao belo texto que ele próprio escreveu aquando da morte de Natalie Wood, única de sensibilidade ferida no filme de Elian Kazan, de entre tantos tão amado e tão especialmente tocante para quem nasceu e viveu numa cidade pequena, e período de tão forte repressão sexual.
Reparo que é este o segundo filme que aqui evoco, o que não é seguramente por acaso para quem, nas soirées e matinées deste mesmo Teatro Micaelense (e nos seus intervalos também, claro está), nas sessões de três filmes ao domingo à tarde no Marítimo, nas sessões duplas do Coliseu, no Cine Vitória e, no Verão, na inesquecível esplanada do Cine-Solar, aprendeu amar o cinema e levou este amor pela vida fora, mesmo quando mais inconstante noutros amores. Aos filmes voltarei, ainda, de resto.
Falar em Esplendor na Relva, a propósito da grande depressão e das medidas adoptadas para o seu combate pode- é certo- espantar, mas quis, sobretudo, com recurso a esta imagem, sublinhar o profundo cometimento cívico de Roosevelt e da geração que o acompanhou, a sua compaixão e determinação em construir um novo pacto social assente na garantia de protecção contra a miséria, a doença, a insegurança e o desemprego. Esses foram de facto, tempos de esplendor e glória para quantos acreditam no interesse público.»

Eduardo Paz Ferreira

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«Este livro baseia-se nas comunicações apresentadas ao I Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt, a assinalar os 90 anos da passagem de FDR pelos Açores, em 1918, quando se encontrava instalada a Base Naval de Ponta Delgada.
A escolha de Roosevelt visa não só assinalar a sua escala no Arquipélago em 1918, mas, sobretudo, o seu papel enquanto arquitecto de uma nova ordem internacional, capaz de retomar a herança de Wilson. Os últimos dias da vida de Roosevelt foram dedicados a lançar as bases da Organização das Nações Unidas. Se olharmos para a caótica estrutura das relações internacionais após a Guerra Fria, o 11 de Setembro e a emergência de novas potências, temos de reconhecer que, com todos os seus limites e imperfeições, a ONU é a principal referência que nos resta, quando quase todas as estruturas aluíram, para tentar construir novos equilíbrios.»

Mário Mesquita

À Procura da Grande Estratégia de Roosevelt a Obama, Coordenação de Mário Mesquita, Sara Pina e Susana Neves, Ed. Tinta da China

quarta-feira, 19 de maio de 2010

O Ecrã Global



Os filmes são o diálogo do mundo de hoje.
Elia Kazan.

“Nascido na idade moderna, com uma técnica moderna e uma finalidade moderna (registar o movimento pela imagem e dá -lo a ver a um público), o cinema é uma arte congenitamente moderna.
A este respeito, a sua «situação» é excepcional na história das artes. Por um lado, é, com a fotografia, a única arte nova surgida em 25 séculos. Por outro, ao contrário das outras artes, ancoradas desde sempre num passado milenar, o cinema surge de uma invenção técnica sem antecedentes, desenvolvendo -se em poucos anos. Béla Balasz sublinha - o: «O cinema é a única arte de que se conhece o dia do seu nascimento. É um acontecimento único na história das civilizações». Eis, de repente, uma arte moderna, virgem tanto no plano estético como técnico: uma arte cujo nascimento é sui generis, criada absolutamente a partir de quase nada e a uma velocidade fulgurante.”

O Ecrâ Global, Gilles Lipovetsky, Jean Serroy, Ed. 70

A época contemporânea é a da proliferação dos ecrãs, mas a omnipresença destes não significa, para os autores, um empobrecimento do pensamento ou da estética, antes obriga a conceber um modelo inédito de inteligibilidade do cinema, dos outros ecrãs e, mais profundamente, da cultura.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

ExtraTexto

Holland House Library Suffers Damage, Hulton-Deutsche Collection, 1940

Contos Tradicionais Açorianos de Teófilo Braga

Teófilo Braga, Columbano Bordalo Pinheiro
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Os Peixes do Guardião

De uma vez estavam os frades comendo no refeitório e coube a um deles um peixe muito pequenino. Este então reparou e viu que no prato do guardião estava um muito grande e que o comia à boca cheia. O frade era ladino e para se vingar do jejum a que o obrigavam abaixou a cabeça sobre o seu peixinho que tinha no prato e começou a momear, como quem estava a conversar em segredo. O guardião reparou nisto e pergunta de lá da cabeceira da mesa:
- Ó irmão, Frei Fulano, então o que é isto que está fazendo?
- Reverendo padre mestre, estava perguntando a este peixinho se alguma vez teria encontrando meu pai que morreu afogado no mar. Mas este respondeu-me que como é muito pequenino não soube disso e quem o poderá saber é o peixe que está no prato de vossa reverência que é muito grande e pode bem dar fé de tudo.
(Ilha de S. Miguel)
Teófilo Braga



“No ano em que se comemora o primeiro centenário da Implantação da República é de toda a justiça revisitar a obra de Teófilo Braga. E porque Teófilo era açoriano, micaelense, urge sobretudo dar a conhecer a obra em que reuniu o património cultural do arquipélago que o viu nascer. Essa obra é hoje mal conhecida, pois os Cantos Populares do Povo Açoriano (1869), reeditados pela Universidade dos Açores em 1982, há muito que se encontram esgotados. Em relação aos contos tradicionais açorianos, estes nunca foram publicados como obra autónoma. Assim, dá-se ora a conhecer esses contos que, até agora, circulavam como parte integrante dos Contos Tradicionais do Povo Português, embora aí figurem ordenados segundo um critério classsificativo temático (que respeitaremos) e não geográfico. Esta edição inclui um estudo introdutório sobre a vida e obra deste estudioso micaelense, a sua importância a nível nacional e internacional, a origem e explicação desses contos, as variantes de alguns deles e sobre a literatura tradicional, em geral. Pretende-se que a obra seja acessível a toda a população, bem como a todos os interessados pela literatura tradicional. Tendo em conta o tipo de divulgação que se pretende, optamos por dar à estampa uma edição que, embora pretendamos correcta do ponto de vista científico, não desejamos que inclua pretenciosismos académicos nem informações supérfluas.”
Contos Tradicionais Açorianos de Teófilo Braga, Anabela Mimoso, Ed. Calendàrio de Letras

sábado, 15 de maio de 2010

Diários de Viagens

Histórias Etíopes

Desenho de Manuel João Ramos
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«Sempre acompanhado de um caderno onde se misturam desenhos e anotações, tenho viajado pela chamada “Etiópia histórica”. Escrevo e desenho para lembrar o que é desaparecer do meu mundo habitual e continuar ainda assim vivo, podendo ver, ouvir, cheirar e falar. Faço-o para criar um testemunho gráfico do que sinto como viagens de ida e volta a um mundo ao contrário. Quando viajei pela primeira vez para a Etiópia, em 1999, ressuscitei um prazer que me tinha negado durante anos, desde a traumática perda de um caderno de desenhos em Tavira: o de desenhar despreocupada mas obsessivamente quando viajo. Desde então, tenho uma consciência mais aguda do que implica fixar, em caderno, clichês memorias: enquanto viajo, o desenho não passa de um subproduto irrelevante da minha actividade de desenhador e fixador de visões, mas quando regresso a casa o desenho torna-se um precioso catalisador da memória e do imaginário.»

Histórias Etíopes de Manuel João Ramos, Ed.Tinta da China.






Viagem Ao Tecto Do Mundo
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Viagem ao Tecto do Mundo - O Tibete Desconhecido relata-nos a viagem inesquecível que Joaquim Magalhães de Castro fez nos anos 90 ao coração do Tibete, o Ngari. Com início na capital, Lhasa, esta intrépida aventura durou cerca de mês e meio e atravessou, em direcção a oeste, quase dois mil quilómetros dalgumas das paisagens mais inóspitas, magníficas e sagradas do planeta. De mochila às costas, viajante clandestino em algumas das regiões por onde passou e muitas vezes transportado nas caixas de camiões, o autor conheceu o Tibete mais recôndito e autêntico, o seu povo, a sua cultura, a grandiosidade dos seus palácios, templos e mosteiros, e a sua profunda religiosidade.

Viagem ao Tecto do Mundo - O Tibete Desconhecido de Joaquim Magalhães de Castro, Ed. Presença

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Açores nas Vidas de Maria Filomena Mónica



“Na Páscoa de 1988, fui aos Açores. Gostei de tudo- do verde, do mar, da pronúncia, do nevoeiro, das araucárias, das lagoas, das cidades, dos metrosíderos, dos vulcões, das hortênsias, do chá, dos campos, dos conventos, dos muros, do queijo, dos «impérios», dos solares e até dos arquivos. Habituada à destruição irracional da paisagem do Continente, fiquei estupefacta com a beleza de Angra, uma cidade que, durante séculos, fora escala das naus que buscavam a África, Índia e as Américas.
Ao chegar ao Faial, dei-me conta de que não se deve falar dos Açores como um todo: cada ilha tem a sua personalidade. Talvez exista um fundo de verdade naquilo que Antero Quental dizia, em carta a Oliveira Martins, com data de 26 de Junho de 1874: «Aqui nos Açores há um provérbio que reza: São Miguel, burgueses ricos; Terceira, fidalgos arruinados; Faial, contrabandistas espertos.»
Aparentando achar mais graça à castiça Angra do que à sua cidade natal- Antero nascera em Ponta Delgada -, dizia ser a Terceira «uma terra essencialmente portuguesa e peninsular» por ter «pobreza, toiros, insouiciance sóbria e sófica, entusiasmo, bizarria e parlapatice», enquanto São Miguel seria, na sua opinião, holandesa e, portanto, «o menos português de quantos cantos do mundo onde se fala a língua de Camões». …
Pouco a pouco, comecei a perceber que, mais do que o Continente, os Açores estavam, e estão, ligados ao mundo. Como escreveu John Updike, as raízes de lava podem prendê-los ao passado, mas o mar permite-lhes um cosmopolitismo de que nenhum outro local se pode gabar.”

Vidas, Biografias, Perfis e Encontros, Maria Filomena Mónica, Aletheia Editores
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Maria Filomena Mónica abalança-se aqui, mais uma vez, ao género biográfico, depois dos seus Cesário Verde, Fontes Pereira de Melo (ambos da Alêtheia), Eça de Queirós (Quetzal), e D. Pedro V (Temas e Debates), para além da sua própria autobiografia, Bilhete de Identidade (Alêtheia Editores).

Polémica, a autora pretendeu «demolir heróis, esquadrinhar as suas vidas, desvendar sentimentos». Dividido em duas partes, o século XIX e o século XX, este livro recupera textos sobre personagens tão díspares como a burguesa família Dabney, do Faial, os reis D. Pedro V e D. Luís, o capitalista conde de Burnay, os «Vencidos da Vida» ou os operários do têxtil, passando depois a retratar os casos reais de um menor em risco e de uma emigrante em Inglaterra, e acabando com uma série de perfis masculinos, sobre a moderna visão do homem, o papa Bento XVI, o rei Juan Carlos, Clint Eastwood, José Sócrates, Francisco Louçã e Aníbal Cavaco Silva.

ExtraTexto

Alfred Hitchcock , 1965

quarta-feira, 12 de maio de 2010

O Museu da Inocência

Interview with Orhan Pamuk from Granta magazine on Vimeo.

O Museu da Inocência é uma história de amor, passada em Istambul, entre a Primavera de 1975 e os últimos anos do século XX, e conta a história da paixão obsessiva do herdeiro de uma família rica, Kemal, por uma prima afastada, Füsun, de um meio social menos favorecido. Mas Kemal está noivo da filha de uma das famílias da elite istambulense. Entretanto, Kemal começa a coleccionar objectos pessoais e outros que lhe fazem lembrar a sua amada. Esses objectos são simultaneamente um fetiche e uma crónica da sua felicidade e das mágoas, um mapa de sinais de todos os sítios onde estiveram juntos. Com o tempo, a compulsão do coleccionador acabará por dar origem a verdadeiro museu, que também permite explorar uma Istambul meio ocidental e meio tradicional, a sua emergente modernidade e a sua vastíssima história e cultura.

O Museu da Inocência de Orhan Pamuk, Ed. Presença.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Snobs

Ilustração de William M. Thackeray
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“Estou farto de Circulares da Corte. Abomino a inteligência haut-ton. Acredito que palavras e expressões como estar na moda, exclusivo, aristocrático e outras semelhantes são epítetos perversos e anticristãos que deveriam ser banidos de qualquer dicionário de confiança. Um sistema de tribunais que relega homens de génio para lugares secundários é, na minha opinião, um sistema snob. Uma sociedade que se pretende elegante e ignora as artes e as letras é, na minha opinião, uma sociedade snob. Vós, que desprezais o vosso vizinho, sois um snob; vós, que vos esqueceis dos vossos amigos só para irdes atrás dos que ocupam um lugar mais alto na sociedade, sois um snob; vós, que tendes vergonha da vossa pobreza e corais da profissão que exerceis, sois um snob, tal como o sois também vós, que vos gabais do vosso pedigree ou tanto orgulho tendes na vossa riqueza.
Rir de pessoas como estas é tarefa de Mr. Punch. Que possa fazê-lo de forma honesta, sem batota, e dizer a verdade enquanto esboça um sorriso rasgado- sem nunca esquecer que o Riso é uma boa coisa, a Verdade é ainda melhor e o Amor a mais importante de todas.”
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Livro Dos Snobs de W. M. Thackeray, Ed. Guerra e Paz
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Através de um conjunto de textos originalmente publicados na revista Punch em 1846 e 1847, Thackeray faz um retrato pormenorizado de cada tipo de snob, traçando-lhes o jeito e o estilo, não poupando nada nem ninguém à sua pena satírica. O humor e o tom familiar quebram a barreira da convenção literária, cativam o leitor e revelam uma sociedade para a qual o snobismo é a paixão maior. A presente edição inclui ainda ilustrações feitas pelo próprio Thackeray para a coluna que assinava como Mr. Snob. William M. Thackeray nasceu em 1811, em Calcutá, e estudou em Cambridge. Fez carreira no jornalismo, antes de se tornar o reconhecido autor de As Aventuras de Barry Lyndon, transposto para o cinema por Stanley Kubrick, e de A Feira das Vaidades, também adaptado ao pequeno e ao grande ecrã. Conhecido pela sua refinada veia humorística, Thackeray morreria na véspera de Natal de 1863, deixando um legado que ainda está, em grande parte, por descobrir.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Submundo



«O poder político a mesclar-se lubricamente com a arte e a literatura. Historiadores de calvas proeminentes na pândega com a gente bonita da sociedade e da moda. Havia diplomatas a dançar com estrelas de cinema e laureados com o prémio Nobel a contar histórias a grandes armadores em clima de grande intimidade, e o demimonde da Broadway e da indústria dos mexericos convivia alegremente com correspondentes estrangeiros.
Havia a percepção constrangida de um momento profundo e intenso em gestação. Uma perspectiva medonha, pensou Clyde, porque sugeria uma continuação dos anos da era Kennedy. Anos esses em que um certo movimento fluido se tornou possível. Em que o sexo, as drogas e os palavrões começaram a delir a natureza estratificada da cultura.»
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Submundo, Don Delillo, Ed. Sextante.
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Submundo é a crónica de vidas ordinárias inseridas no último meio século da história americana. No imenso palco do romance, elas cruzam-se com figuras que marcaram a época – J. Edgar Hoover, Frank Sinatra, entre outras. DeLillo faz surgir uma obra de arte deslumbrante do outro lado, obscuro e escondido, da humanidade contemporânea.Adorado pela crítica, nomeado para o National Book Award (1997), para o Pulitzer Prize (1998), segundo classificado no prémio que distingue o melhor romance americano dos últimos 25 anos e vencedor, em 2000, de uma medalha da American Academy os Arts and Letters pela mais eminente obra de ficção dos últimos anos. O seu autor, Don DeLillo, é recorrentemente apontado ao Nobel da Literatura e está na vitrina da melhor ficção norte-americana ao lado de autores como Salinger, Pynchon ou Cormac McCarthy.

Submundo é um livro magnífico de um mestre americano. Salman Rushdie

Clausura atlântica


Bruma das almas nesta clausura atlântica!...
É nela que se instala o gosto da solidão,
que dá à sua gente simples o poder de se isolarem do mundo,
como se no seu isolamento só elas vivessem
sobre a face da terra.
.Armando Côrtes-Rodrigues

sexta-feira, 7 de maio de 2010

De Bicicleta com David Byrne

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Desde o princípio dos anos 1980 que David Byrne usa a bicicleta como principal meio de transporte em Nova Iorque. Há vinte anos, descobriu as bicicletas desdobráveis e começou a levá-las para as tournées e outras viagens de recreio. A escolha de Byrne deveu-se mais à conveniência do que a qualquer motivação política. E à medida que via mais cidades a partir da sua bicicleta, foi ficando apanhado por este meio de transporte e pela sensação de liberdade que o mesmo proporciona. Convencido de que o ciclismo urbano favorece um conhecimento mais profundo da pulsação e do ritmo das populações e topografias, Byrne começou a escrever um diário com as suas observações.

De Berlin a Buenos Aires, de Istambul a São Francisco, de Sydney a Nova Iorque, Diário da Bicicleta regista não só o que Byrne vê e quem encontra, como também as suas reflexões sobre world music, urbanismo, moda, arquitectura, e muito mais, numa combinação pessoalíssima de humor, curiosidade e humildade.

Diário da Bicicleta de David Byrne, Ed.Quetzal.


quarta-feira, 5 de maio de 2010

Guilherme de Figueiredo lança "Campo Santo"

Lançamento do livro "Campo Santo" de Guilherme de Figueiredo from ARTilharia TV on Vimeo.

A colectânea de fotografias, debruça-se sobre as festividades do Senhor Santo Cristo dos Milagres, através de figuras e situações captadas pela objectiva do autor. O grafismo é de José Albergaria. Trata-se duma edição Publiçor. O evento decorreu na Livraria Solmar em Ponta Delgada

terça-feira, 4 de maio de 2010

Provas de Contacto

Apresentação do livro Campo Santo/ Guilherme Figueiredo
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«No tempo da minha infância e juventude, a porta central da Igreja do Senhor Santo Cristo dos Milagres estava repleta de pequeninos escritos, de grandes preces. A lápis ou a esferográfica, rogasse ao Senhor Santo Cristo; a cura de um filho, a protecção para um marido ausente, uma boa nota no exame que se aproxima.
Às vezes a fé é assim.
Às vezes até tem caligrafia.»
Emanuel Jorge Botelho
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« Talvez por isso que, embora apresentando-se de modos tão diversos e representando classes sociais tão diferentes, seja em todos evidente uma postura de solenidade, que não é posta em causa pela simplicidade dos mais pobres, nem pela exuberância dos emigrantes. Esta gravidade sincera traduz o lado mais humano da maneira de ser, aquele com que se consegue tocar a Deus.»
Jorge Santos

A Viúva Grávida


Estamos no Verão de 1970- um Verão longo e quente. Num castelo em Itália, meia dúzia de jovens flutuam sobre um mar de mudança, levados na corrente da revolução sexual. As raparigas comportam-se como rapazes e os rapazes continuam a comportar-se como rapazes. E Keith Nearing - um estudante de literatura com vinte anos, às voltas com o romance inglês- luta para que o feminismo e o novo poder das mulheres reverta a seu favor.
A revolução sexual pode ter sido uma revolução de veludo, mas não aconteceu sem derramamento de sangue…
A Viúva Grávida é uma comédia de costumes, um pesadelo. Um livro brilhante, assombroso e gloriosamente arriscado.
É Martin Amis no auge da sua audádicia.

sábado, 1 de maio de 2010

Adoecer

Ophelia - John Everett Millas


« O facto de se achar naquele recinto, onde também os Pré-Rafaelitas estavam representados com pinturas, devolvia aos seus modos a altivez que mantivera dominada em Sheffield. Ela sabia usar todo o poder que tinha o seu cabelo e, ao levar as mãos à nuca, para o desprender, sabia o que fazia. Apenas uma espécie de mulheres, para além das rameiras, exibia a cabeleira solta. Eram mulheres que existiam a duas dimensões e cuja improbabilidade sexual lhes permitia quase uma nudez. Mesmo as figuras das fotografias buscavam um estatuto de inocência igual à das pintadas sobre tela. Na Exposição, no meio de muitas outras que, com a sua novidade técnica, desorientavam o olhar do público, a visita de um jovem a um bordel onde o esperavam cortesãs despidas provocou atitudes de censura. Mas a rainha decidiu que não passava de uma obra de arte e retirou-lhe o peso do real. Ela, a quem se devia a inspiração para a moralidade de uma época, comprou-a por dez libras para o marido.
Lizzie, com o seu cabelo desarranjado como por acidente de viagem, e onde a pequena touca não passava de uma folha caída, cruzava uma influência com os quadros. Saía deles, ardendo, sem que a chama fosse mais do que luz e pigmento. O próprio nome dessa cor, Ticiano, provindo do pictórico, fugia ao catálogo comum. O termo «ruiva», que subentendia a crença em marcadores genéticos de aviso sobre pessoas pouco aconselháveis, foi-lhe aplicado com frequência. No entanto, o que quer que existisse de vermelho perdia-se na massa acobreada. A chuva que caía sobre os vidros daquele tecto em abóbada não podia apagar todo o brilho que emanava.»
sua voz intensidade erótica que prevenisse Lizzie contra o homem que estava a querer entrar na sua vida.»
Adoecer,
de Hélia Correia, Relógio d'Água, 2010.

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«O “mito Lizzie” declina-se em algumas palavras: beleza romântica e doentia, inclinações mórbidas, atracção pelo decadente, destino trágico e transgressão dos códigos a que as mulheres estavam sujeitas (e, neste sentido, há nela um princípio de afirmação feminista longamente explorado no romance de Hélia Correia). Ela é uma presença misteriosa e espectral, vinda de uma zona de trevas que não é contemporânea do seu tempo. Daí a atracção que exerce sobre aquele grupo de tard venus (mas, ao mesmo tempo, vanguardistas), fascinados pelas fantasmagorias da história. No romance de Hélia Correia, a doença é mais do que um leitmotiv, é um acontecimento (daí, o infinitivo do título: “Adoecer”) que emerge como uma verdadeira personagem, o sujeito de uma narrativa. Na beleza e na doença (as duas coisas estão intimamente ligadas), Lizzie representa um ideal feminino (…). Ela é, em sim, uma personagem romanesca, eminentemente literária. E é esta dimensão que surge aqui explorada exaustivamente.»
(António Guerreio, Actual, 24 ABR)