«O céptico, ao contrário do que é voz corrente, não é o que
não crê em nada, é antes aquele que pergunta e encontra através da interrogação
(...). O céptico dos cafés desfaz de tudo, incluindo da possibilidade de
conhecimento, enquanto o céptico filosófico constrói um mundo e o seu processo
de demonstração por tentativas costuma ser ao mesmo tempo exigente, subtil e
delicado. Ora um dos principais objectivos deste livro consiste em tentar
mostrar a complexidade de que se reveste a realidade e a forma como, para além
da primeira aparência, novas evidências surgem em torno dos acontecimentos
públicos, dos factos históricos e dos seus intérpretes (…).
Outra razão para a sensação de proximidade com os textos provém sem dúvida da
própria contemporaneidade dos factos a que alude (…). Mário Mesquita examina-os
com uma paixão escondida, uma tenacidade própria dos lutadores intelectuais que
cedo se impuseram a si mesmos raramente dizer eu, a não ser em termos de
testemunha ou sujeito de pensamento. (…) Podemos ir de novo ao encontro das
imagens da queda do Muro de Berlim, reviver o optimismo dos anos 90 a empurrar
as velas enfunadas da Europa de então, reconstituir o arco de triunfo erguido
ao modelo da economia de mercado, observar como os Cinco Continentes se transformaram
numa pangeia do capitalismo sustentado pela globalização, podemos recordar como
o sistema bancário nos proporcionou viver no futuro, ou ainda examinar como no
meio de uma espécie de esperança total na virtude do ideal democrático, se
popularizou a ideia do fim da história.»
Lídia Jorge, do Prefácio
O Estranho Dever Do Cepticismo, Mário Mesquita, Tinta da China, 2013.