segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Torto Arado de Itamar Vieira Junior


Torto Arado
Prémio LeYa 2018
ITAMAR VIEIRA JUNIOR 


Bibiana e Belonísia são filhas de trabalhadores de uma fazenda no Sertão da Bahia, descendentes de escravos para quem a abolição nunca passou de uma data marcada no calendário. Intrigadas com uma mala misteriosa sob a cama da avó, pagam o atrevimento de lhe pôr a mão com um acidente que mudará para sempre as suas vidas, tornando-as tão dependentes que uma será até a voz da outra. Porém, com o avançar dos anos, a proximidade vai desfazer-se com a perspectiva que cada uma tem sobre o que as rodeia: enquanto Belonísia parece satisfeita com o trabalho na fazenda e os encantos do pai, Zeca Chapéu Grande, entre velas, incensos e ladainhas, Bibiana percebe desde cedo a injustiça da servidão que há três décadas é imposta à família e decide lutar pelo direito à terra e a emancipação dos trabalhadores. Para isso, porém, é obrigada a partir, separando-se da irmã.
Numa trama tecida de segredos antigos que têm quase sempre mulheres por protagonistas, e à sombra de desigualdades que se estendem até hoje no Brasil, Torto Arado é um romance polifónico belo e comovente que conta uma história de vida e morte, combate e redenção, de personagens que atravessaram o tempo sem nunca conseguirem sair do anonimato.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Os Melhores Livros que Lemos em 2018



Ontem, na SolMar, foi tempo de retrospetiva, em mais uma edição “Livros do Ano 2018”, ao que à literatura e ao mundo dos livros concerne.
A livraria elegeu como acontecimento literário do ano o “Encontro Literário – Arquipélago de Escritores” uma iniciativa da Câmara Municipal de Ponta Delgada, com curadoria de Nuno Costa Santos. O acontecimento literário do ano foi para a publicação da Obra Completa de Vitorino Nemésio, editado pela Companhia das Ilhas e Imprensa Nacional. Joel Neto com Meridiano 28 foi o livro mais vendido na livraria.
Acontecimentos que marcaram o ano transato pela negativa: o encerramento de muitas livrarias independentes em todo o país, e ainda a não atribuição do Prémio Nobel da Literatura.
Por último, e em jeito de humilde homenagem ficou assinalado o desaparecimento da escritora açoriana Adelaide Freitas e o editor Bruno da Ponte. 
Para os convidados deste ano, Maria Brandão, Isabel Barata, Urbano Bettencourt e Nuno Barata Almeida Sousa, a ficção esteve em destaque, passando ainda pelo ensaio e poesia.
Maria Brandão escolheu: A Ordem do Dia de Éric Vuillard, ed. D. Quixote, A Noite do Professor Andersen de Dag Solstad, ed. Cavalo de Ferro e Brincadeira e Divertimento de James Salter, ed. Livros do Brasil.
Isabel Barata: Uma História Antiga de Jonathan Littell, ed. D.Quixote, Caros Fanáticos de Amos Oz, ed. D.Quixote, A Praia de Manhathan de Jennifer Egan, ed. Quetzal e Raposa de Dubravka Ugersic, ed. Cavalo de Ferro.
Urbano Bettencourtt: Obras Completas de José Martins Garcia e Vitorino Nemésio, ambas da Companhia das Ilhas, Um Perigoso Leitor de Jornais de Carlos Tomé, ed. Artes e Letras, Meridiano 28 de Joel Neto, ed. Cultura, Vai Chover Amanhã de Maria de Fátima Borges, Corpo Triplicado de Maria Brandão, ed. Companhia das Ilhas.
Por fim, Nuno Barata escolheu: Os Açores e os Novos Média de Osvaldo Cabral, Fundo da Gaveta de Vasco Pulido Valente, ed. D.Quixote, Identidades de Francis Fukuyama, ed. D. Quixote, Eliete de Dulce Maria Cardoso, ed.Tinta da China. Falou ainda da reedição da obra de José Martins Garcia, de Rufina de Miguel Albergaria e de Corpo Triplicado de Maria Brandão, ambas da Companhia das Ilhas.
A sessão encerrou com o desejo de um 2019 frutuoso em boas leituras e boas edições.

sábado, 2 de fevereiro de 2019

Emanuel Jorge Botelho (POR CAUSA DO LEONARDO)




FRAGMENTOS DE UMA TALVEZ POÉTICA,

E OUTRAS LINHAS ADICIONAIS

(POR CAUSA DO LEONARDO)






As palavras são coisas de andar no bolso; agarradas, protegidas, sabendo que o rumor dos dedos nunca as fere, nem magoa.

Foi sempre assim desde o tempo em que o silêncio nos falou de Deus, e a primeira palavra, saindo de uns lábios toscos, se foi esconder, medrosa, num canto do Mundo.

A primeira palavra sentiu, certamente, muito medo de ter nome.

Com a primeira palavra nasceu o primeiro verso – porque o que foi por ela enunciado estava dentro do que dizia; era um dizer pronto a ser semente, e flor, e ventania.



Os grandes poetas tocam esse tempo iniciático. São gente que fala, em silêncio, do lume, da água, de um trevo de dar sorte que, às vezes, nos surpreende, solitário, no chão bravio.

Para um grande poeta o achamento das palavras, das palavras de escrever, é moroso e ganho a pulso.

O seu ofício é resgatá-las da língua e dar-lhes a liberdade de se dizerem. Até na sua mudez secreta, se necessário for.



Não sei se Portugal é um país de poetas.

Sei, e digo-o rente ao orgulho, que é a morada de alguns grandes poetas.

Gente que respeitou, e respeita, o abraço (indefeso) do papel e lhe ofereceu, e oferece, o que há de casto no risco, alado, de um verso branco.



O meu amigo Leonardo de Sousa é um grande poeta.

E é-o desde sempre.

O seu há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida era, já, uma obra madura.

O Leonardo não começou por tropeçar nos versos.

Cedo atravessou com eles a passadeira da escrita e chegou, em segurança, ao outro lado…

Eu vinha aqui apresentar o seu livro mais recente – caderno de mitos pessoais, a que a Artes e Letras deu chancela.

Confesso que não sei se o fiz; mas não faz mal!

Os livros, permitam-me o palpite, já devem estar um pouco fartos de serem apresentados.



Resta-me dizer-vos: até sempre!

E abraçar, com a mão, um grande poeta.




EMANUEL JORGE BOTELHO
(LIVRARIA ARTES E LETRAS 17.1.2019)