terça-feira, 19 de agosto de 2014

Os Rostos da Escrita




Quando, aos dezoito anos, retratei pela vez um escritor, Jorge Luís Borges, não podia sequer imaginar a aventura que se abria no meu caminho de fotógrafo. Fui o primeiro a surpreender-me ao descobrir, muitos anos depois, que a magia dessa fotografia dependia do halo de luz que parecia voltear em torno de uma mão anónima. Mais tarde teria tempo de confirmar que cada foto é um salto para o desconhecido, em que factores imprevisíveis modelam e matizam uma identidade.
Ao sair da Argentina, partilhei viagens e atribulações com amigos escritores e percebi, entre outras coisas, que também o seu trabalho oscila entre o que queriam dizer e o que as palavras lhes permitem.
O meu encontro com Luis Sepúlveda (e depois dele com tantos escritores) confirmou a intuição de que a minha vida teria a ver com duas margens do Atlântico. Além disso, Sepúlveda, com o seu talento para fazer de cada pessoa e de cada história uma experiência fundamental e irrepetível, deixou-me perceber que era isso também que eu pretendia: que cada foto fosse um momento único e que nesse momento coubesse, por inteiro, o próprio rosto da escrita.

Daniel Mordzinski, Os Rostos da Escrita                                                 



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