sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Ao meu Avô I

Lagoa de Santo André, antes e depois

“Ano atrás, saindo à areia, Daniel, com longo sopro num búzio, avisava a praia que o almoço ou o jantar estavam prontos. Na falta da antiga e bela forma de notícia é a fome, agora, que marca a hora das refeições.
Cada família na mesa habitual, Daniel ou a mulher, a senhora Maria, nossa comadre, ou os filhos, cunhados, sobrinhos, conforme aconteça encontrarem-se ali, distribuem as panelas de peixe, os bifes, as garrafas de vinho. A meio da refeição, Daniel, munido de prato e talher, escolhe, por simpatia de momento, uma das mesas­-“ Com licença, que também preciso”- e come, de conversa com os clientes.
Pitoresco nas descrições, directo e franco na apreciação de indivíduos e de acontecimentos, é seu pendor falar de modo a que todos o oiçam. Desconhecedor de interjeições, tais como apre, cáspite, usa, público e raso de palavras de pura raiz vicentina.
Um exemplo: certo dia, almoçávamos, pára, em baixo, onde a estrada termina, já dentro da areia, um majestoso último modelo e sai, vestindo de acordo com a magnificência do carro, um casal de meia-idade. Pelo estrado sobem a “ Chez Daniel”, sentam-se na única mesa vaga, examinando, em volta, discretos mas um tanto desconfiados, pessoas e comidas.”
Manuel da Fonseca - À Lareira Nos Fundos Da Casa Onde o Retorta Tem o Café

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