segunda-feira, 22 de setembro de 2014

A Incrível Viagem do Faquir




Ajatashatru Larash Patel, faquir de profissão, que vive de expedientes e truques de vão de escada, acorda certa manhã decidido a comprar uma nova cama de pregos. Abre o jornal e vê uma promoção aliciante: uma cama de pregos a €99,99 na loja Ikea mais próxima, em Paris. Veste-se para a ocasião - fato de seda brilhante, gravata e o seu melhor turbante - e parte da Índia com destino ao aeroporto Charles de Gaulle. Uma vez chegado ao enorme edifício azul e maravilhado com a sapiência expositiva da megastore sueca, decide passar aí a noite a explorar o espaço. No entanto, um batalhão de funcionários da loja a trabalhar fora de horas obriga-o a esconder-se dentro de um armário, prestes a ser despachado para Inglaterra. Para o faquir, é o começo de uma aventura feita de encontros surreais, perseguições, fugas e aventuras inimagináveis, que o levam numa viagem por toda a Europa e Norte de África.

A incrível viagem do faquir que ficou fechado num armário IKEA é uma aventura rocambolesca e hilariante passada nos quatro cantos da Europa e na Líbia pós-Kadhafi, uma história de amor mais efervescente do que a Coca-Cola, mas também o reflexo de uma terrível realidade: o combate travado por todos os clandestinos, últimos aventureiros do nosso século.
 
Romain Puértolas nasceu em Montpellier, em 1975. Quando era novo, queria ser cabeleireiro-trompetista, mas o destino trocou-lhe as voltas. Oscilando entre a França, a Espanha e a Inglaterra, foi sucessivamente DJ, compositor-intérprete, professor de línguas, tradutor-intérprete, comissário de bordo, mágico, antes de tentar a sua sorte como cortador de mulheres num circo austríaco.
Rapidamente despedido por ter mãos escorregadias, resolve dedicar-se à escrita compulsiva. Autor de 450 romances num ano, ou seja, 1,2328767123 romances por dia, consegue finalmente arrumar os seus próprios livros numa estante Ikea. Infelizmente, despojado de 442,65 dos seus romances por extraterrestres dotados de uma inteligência e um gosto bem acentuados, Romain Puértolas vê-se reduzido a uma estante estilo caixote de pêssegos periclitante e desesperadamente vazia.
A Incrível Viagem do Faquir que Ficou Fechado num armário Ikea, Romain Purértolas, Porto Editora, 2014.
 
 


quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Porque Não Existe o Mundo

                                                     A Leitora à Janela, Vermeer


“Esta pintura possui níveis diversos que interagem com a diferença entre a realidade e a ficção ou, em geral, com as diferenças entre o ser e a sua aparência. A luz cai sobre a pintura, proveniente de uma fonte invisível do lado de fora da janela na metade esquerda da cena, o que atrai a nossa atenção. A cena está diante de nós como num palco, com um cortinado verde puxado para trás, o sublinha a estrutura cénica da pintura. A jovem recebeu uma mensagem escrita que está a ler e é muito provavelmente de uma mensagem amorosa que se trata. As faces estão ligeiramente coradas, o que podemos interpretar como manifestação de vergonha. Além disso, o cortinado é da mesma cor do seu vestido, o que pode ser interpretado, com alguma perspicácia psicanalítica, como uma expressão da vontade que tem quem observa a pintura (que somos nós) de a despir com os olhos. Até porque a observamos numa cena íntima. Um outro indício do tom sexual subjacente à pintura está contido na tigela com a fruta, ligeiramente entornada, de onde caiu um pêssego semicómico, encontrando-se a tigela sobre uma cama de roupa revolta. É de notar, além disso, que a jovem não se volta para a fonte de luz mas sim para acarta que tem na mão e que lê com ar ansioso, aparecendo refletida no vidro da janela aberta. Isto pode ser uma referência crítica ao tema pecado. A jovem rejeita a fonte de luz divina e dá importância aos seus desejos mundanos.”
 
A vida, o universo e tudo o resto – é possível que todos nos interroguemos muitas vezes sobre o que significam. E qual é a nossa situação no meio disto tudo? Seremos apenas um monte de partículas elementares num contentor gigantesco à escala mundial? Ou constituirão os nossos pensamentos, os nossos desejos e as nossas esperanças uma realidade própria e, nesse caso, que realidade constituem? Como podemos compreender a nossa existência ou, mesmo, a existência, em geral? E qual é o alcance do nosso conhecimento? Nesta obra desenvolvo o princípio de uma nova filosofia que parte de um simples pressuposto básico: o mundo não existe. Como o leitor verá, isto não significa que nada exista. O nosso planeta existe, tal como existem os meus sonhos, a evolução, os autoclismos, a queda de cabelo, a esperança, as partículas elementares e até mesmo os unicórnios na Lua, só para citar algumas coisas. O princípio de que o mundo não existe significa que tudo isso existe mas de maneira diferente.» Gabriel não é apenas o professor de filosofia mais jovem da Alemanha, mas também um pensador estimulante, que nos propõe respostas originais para as grandes perguntas da humanidade.
 
Porque Não Existe o Mundo, Markus Gabriel, Temas e Debates, 2014.
 
 

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Herzog




 «Se estou fora de mim, isso não me importa, pensou Moses Herzog.»

 
Publicado pela primeira vez há exatamente 50 anos e considerado um dos maiores romances de Saul Bellow, Herzog conta a história de Moses Herzog, intelectual de muitos conflitos e de sofrimentos emocionais e filosóficos, mas também homem de grande charme.
A sua existência está a desintegrar-se em todos os domínios. Herzog falhou enquanto escritor, enquanto académico, enquanto pai, enquanto marido e amigo - perdeu a segunda mulher e o melhor amigo, que o traíram um com o outro e agora formam um novo casal.
Apesar de tudo, Herzog vê-se como um sobrevivente e aplica o seu inconformismo e a sua ira na escrita de cartas (que nunca chegará a enviar) para amigos, inimigos, rivais, colegas, pessoas famosas - vivas e mortas -, e em que revela a sua invulgar visão do mundo.
Uma agudíssima observação da vida pública e privada, no mais autobiográfico romance de Saul Bellow.
Herzog, Saul Bellow, Quetzal, 2014.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Os Interessantes



Numa noite de verão de 1974, seis adolescentes planeiam uma amizade para toda a vida.  Jules, Cathy, Jonah, Goodman, Ethan e Ash ensaiam a atitude cool que (esperam) os defina como adultos. Fumam erva, bebem vodka, partilham os seus sonhos. E, juram, serão sempre Os Interessantes. Ao longo da adolescência, o talento artístico destes seis amigos foi sempre satisfeito e encorajado. Mas o tipo de criatividade que é celebrada aos 15 anos nem sempre é suficiente para impulsionar a vida aos 30 – para não falar dos 50. Nem todos vão conseguir manter viva a chama que os distingue na juventude. Décadas mais tarde, a amizade mantém-se embora tudo o resto tenha mudado. Jules, que planeava ser atriz, resignou-se a ser terapeuta. Cathy abandonou a dança. Jonah pôs de lado a guitarra para se dedicar à engenharia mecânica. Goodman desapareceu. Apenas Ethan e Ash se mantiveram fiéis aos seus planos de adolescência. Ethan criou uma série de televisão de sucesso e Ash é uma encenadora aclamada. Não são apenas famosos e bem-sucedidos, têm também dinheiro e influência suficientes para concretizar todos os seus sonhos. Mas qual é o futuro de uma amizade tão profundamente desigual? O que acontece quando uns atingem um extraordinário patamar de sucesso e riqueza, e outros são obrigados a conformar-se com a normalidade?

Entrevista

Uma geração na esquina entre o talento e o dinheiro


No princípio houve a ideia da inveja. A inveja sossegada, silenciosa, de quem amamos. A inveja que é difícil de confessar e, antes disso, de admitir; por oposição à inveja que se grita. Uma inveja sem “qualquer poder autónomo”, “doentia e progressiva”. Colada a essa ideia, surgiu então a ideia de talento e do que se faz com ele. Não num momento, mas ao longo da vida. O que acontece ao talento, “essa coisa fugidia”, que se pode ou não apurar, activar, revelar ou, simplesmente, não ter? “O talento faz-nos suportar a vida”, acredita uma das personagens talentosas. A frase surge agora citada, dita entre aspas pela sua criadora, como se pelo facto de lhe ter atribuído uma autoria, mesmo que ficcional, deixasse de ter propriedade sobre ela. Ri. Haverá de falar dessas vidas fictícias mais à frente na conversa.

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terça-feira, 9 de setembro de 2014

A Peregrinação do Rapaz sem Cor




“Tudo se precipitou durante as férias de verão, entre o primeiro semestre e o segundo. Foi a partir dai que, à imagem do que acontece nas vertentes escarpadas de uma montanha, cada qual com o seu tipo de vegetação, a vida de Tsukuru conheceu uma transformação radical”

Nos seus dias de adolescente, Tsukuru Tazaki gostava de ir sentar-se nas estações a ver passar os comboios. Agora, com 36 anos feitos, é engenheiro de profissão e projeta estações, mas nunca perdeu o hábito de ver chegar e partir os comboios. Lá está ele na estação central de Shinjuku, ao que dizem «a mais movimentada do mundo», incapaz de despregar os olhos daquele mar selvagem e turbulento «que nenhum profeta, por mais poderoso, seria capaz de dividir em dois». Leva uma existência pacífica, que talvez peque por ser demasiado solitária, para não dizer insípida, a condizer com a ausência de cor que caracteriza o seu nome. A entrada em cena de Sara, com o vestido verde-hortelã e os seus olhos brilhantes de curiosidade, vem mudar muita coisa na vida de Tsukuru. Acima de tudo, traz a lume uma história trágica, que a memória teima em não esquecer. Os quatro amigos de liceu, donos de personalidades diferentes e nomes coloridos, cortaram relações com eles sem lhe dar qualquer explicação. Profundamente ferido nos seus sentimentos, Tsukuru perdeu o gosto pela vida e esteve a um passo da morte. A páginas tantas, lá conseguiu não perder a carruagem. Com "Os Anos de Peregrinação" de Liszt nos ouvidos, regressa à cidade que o viu nascer e atravessa meio mundo, viajando até à Finlândia, em busca da amizade perdida. E de respostas para as perguntas que andam às voltas na sua cabeça e lhe queimam a língua. Será que o rapaz sem cor vai ser capaz de seguir em frente? Arranjará finalmente coragem para declarar de vez o seu amor por Sara? Uma inesquecível viagem pelo universo fascinante deste escritor japonês que chega a milhões de leitores espalhados pelo mundo inteiro. Um romance marcadamente intimista sobre a amizade, o amor e a solidão dos que ainda não encontraram o seu lugar no mundo

A Peregrinação do Rapaz Sem Cor, Haruki Murakami, Casa Das Letras, 30 setembro, 2014.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

O Pintassilgo




 
 
 
 
Vencedor do Prémio Pulitzer de Ficção 2014, um dos mais importantes galardões mundiais. "O Pintassilgo" é um livro poderoso sobre amor e perda, sobrevivência e capacidade de nos reinventarmos, uma brilhante odisseia através da América dos nossos dias, onde o suspense e a arte são dois elementos decisivos para agarrar o leitor.  «O Melhor Livro de 2013» segundo a amazon.com«Um dos 10 Melhores Livros de 2013» – The New York Times   Theo Decker, um adolescente de 13 anos, vive em Nova Iorque com a mãe com quem partilha uma relação muito próxima e que é a figura parental única, após a separação dos pais pouco antes do trágico acontecimento que dá início a este romance. Theo sobrevive inexplicavelmente ao acidente em que a mãe morre, no dia em que visitavam o Metropolitan Museum. Abandonado pelo pai, Theo é levado para casa da família de um amigo rico. Mas Theo tem dificuldade em se adaptar à sua nova vida em Park Avenue, e sente a falta da mãe como uma dor intolerável. É neste contexto que uma pequena e misteriosa pintura que ela lhe tinha revelado no dia em que morreu se vai impondo a Theo como uma obsessão. E será essa pintura que finalmente, já adulto, o conduzirá a entrar no submundo do crime. "O Pintassilgo" foi concluído ao fim de 11 anos e pelo seu impacto mundial os produtores de «The Hunger Games» já anunciaram uma adaptação ao cinema. «Uma obra-prima» The Times «Uma obra surpreendente… Se alguém perdeu o gosto pela leitura, irá reencontrá-lo com "O Pintassilgo".» The Guardian «Deslumbrante… Um romance poderoso na linha de Dickens, que reúne os notáveis talentos narrativos de Donna Tartt numa sinfonia arrebatadora, lembrando ao leitor o prazer de ficar acordado durante toda a noite a ler.» The New York Times «O Pintassilgo é um daqueles livros raros que aparecem uma meia dúzia de vezes por década; um magnífico romance literário capaz de tocar tanto o coração como a mente… Donna Tartt criou uma extraordinária obra de ficção.»Stephen King «Um romance de formação, soberbamente escrito, povoado de personagens elegantemente construídas, que segue a estranha ligação de um rapaz a um pequeno quadro famoso. Um livro que estimula a mente e toca o coração.»  
 
Dona Tartt, "O Pintassilgo", Ed.Presença, 2014.


segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O GRITO DE MUNCH, revisitação II





O GRITO DE MUNCH, revisitação II
                                                 
                                                       para o Urbano

 
o  problema, meu irmão,
é  que, tanto tempo ido,
continua, entre as mãos, um pano de cicatriz,
esse lugar onde enxugamos a repulsa
antes que o grito seja a pedra da morte.

 
não cabe mais nada na hora do medo
e poucas palavras restam
para  dizer o seu nome.
é  assim que nascem as lágrimas,
é  por isso que a moldura não interessa.



Emanuel Jorge Botelho, Fecho As Cortinas, E Espero, Ed. Averno, 2014.